04 • a palavra que resta
- pri muniz
- 9 de set. de 2024
- 2 min de leitura
uma carta de amor fechada, um amor em aberto
“tem palavra que a gente escuta na vida e parece poesia / têm palavras que se esticam e esticam o horizonte da gente / tem palavra que faz o contrário também, encolhe e escurece a vista da gente”
antes de cícero escrever a carta, prometeu a raimundo que ia ensiná-lo a ler. mas isso foi antes. depois só sobrou a carta. inteira, fechada, amassada no bolso esquerdo da camisa de raimundo, que ainda não sabia ler.
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“a palavra que resta” é uma história curta que se divide entre a delicadeza e a brutalidade dais quais as relações humanas são capazes. ao longo das cento e cinquenta páginas, acompanhamos raimundo e sua carta, que conduz uma narrativa onde não existe espaço para idealizações do amor romântico, apenas para a construção árdua do amor realista, tanto de raimundo com cícero quanto de raimundo com suzzanný.
stênio conduz seus personagens de forma muito genuína, principalmente quando traz à tona a forma como o machismo destrói os próprios homens e quando nos lembra da importância daqueles "que teimam em não obedecer" às regras - aqueles que, como raimundo, um dia sobem na boleia de um caminhão e vão embora, viver como tem que ser.
ilustração linda da daniela reis
sei que algumas pessoas se incomodam com fluxos de consciência e que, em alguns momentos, a escrita de stênio pode parecer confusa. mas eu entendo o caos. eu entendo, stênio. um livro como esse não tinha como ser escrito de outra forma. teu texto é a tua carta que a gente abriu. obrigada pela escrita.
“não tem palavra que chegue, o jeito é catar as poucas que tem e falar”
fernanda oliveira / divulgação
stênio gardel nasceu em limoeiro do norte, interior do ceará. a palavra que resta é seu primeiro romance. em 2023, ao lado da tradutora bruna dantas lobato, gardel recebeu o national book award de melhor obra traduzida de literatura, pela edição em inglês de a palavra que resta, the words that remain. (companhia das letras)
para além do livro:
o primeiro brasileiro a receber o national book award
“a palavra que resta” merece o prêmio? (sim!)
uma conversa com stênio e socorro acioli